Em quem pensar, agora, senão em ti?
Tu, que me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a manhã da minha noite.
É verdade que te podia dizer:
«Como é mais fácil deixar que as coisas não mudem
sermos o que sempre fomos, mudarmos apenas dentro de nós próprios?
Mas ensinaste-me a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou
até sermos um apenas no amor que nos une, contra a solidão que nos divide.
Mas é isto o amor: ver-te mesmo quando te não vejo
ouvir a tua voz que abre as fontes de todos os rios
mesmo esse que mal corria quando por ele passámos
subindo a margem em que descobri o sentido de irmos contra o tempo
para ganhar o tempo que o tempo nos rouba.
Como gosto, meu amor, de chegar antes de ti
para te ver chegar: com a surpresa dos teus cabelos
e o teu rosto de água fresca que eu bebo, com esta sede que não passa.
Tu: a primavera luminosa da minha expectativa
a mais certa certeza de que gosto de ti, como gostas de mim
até ao fim do mundo que me deste.
Nuno Júdice, in 'Pedro, Lembrando Inês'
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