sábado, 31 de janeiro de 2015

Muitos Céus....


Eu acho que há muitos céus,
 Um céu para cada um.
 O meu céu não é igual ao seu.
 Porque céu é o lugar de reencontro
 Com as coisas que a gente ama e o tempo nos roubou.
 No céu está guardado tudo aquilo que a memória amou.

” (Rubens Alves)
foto//Totu K..

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Amanhece....



O dia amanhece
 Na juventude, quando começa
A crescer, há um outro que
 Ao alto ergue o esplendor e, como os potros
 No freio, range os dentes ouvindo ao longe
Os ares o seu agir,
 E está satisfeito.
 Os rochedos porém precisam de fendas
 E a Terra de sulcos,
 Senão inóspita seria, sem descanso;
 Porém o que aquele grande rio opera
 Ninguém sabe.

 F. Hölderlin
 foto- Serban Bogdan

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Solidão...


                                   
Que minha solidão me sirva de companhia.
Que eu tenha a coragem de me enfrentar.
 Que eu saiba ficar com o nada
 E mesmo assim, me sentir
 Como se estivesse plena de tudo...

 Clarice Lispector
                           

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Absurdos....



A vida está cheia de uma infinidade de absurdos
 Que nem sequer precisam de parecer verosímeis
 Porque são verdadeiros
.
 Luigi Pirandello
 foto // Hardibudi

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Nem sorrindo nem triste.....


Hoje nem estava sorrindo
 Também não estava triste
 Estava apenas eu...
 Ouvindo música tão minha
 Num mundo só meu........


 Desconheço autor.
...

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Estranho fulgor...



 Deu-me Deus bodas vermelhas
 E palavras como abelhas
 Esquecendo-se de mim.
 Deu-me a paz de alguns minutos
 E palavras como frutos
 Esquecendo-se de mim.
 Deu-me as ideias formosas E palavras como rosas,
 Esquecendo-se de mim.
 Deu-me a voz que persuade Muito mais do que a verdade
 Esquecendo-se de mim.
 Mas um dia, veio a dor Veio o castigo sem fim
 Veio esse estranho fulgor
 Apartando o bem do mal
 E vi que Deus afinal
 Já se lembrava de mim...

 Pedro Homem de Mello


domingo, 25 de janeiro de 2015



Dai-me rosas e lírios,
Dai-me flores, muitas flores
Quaisquer flores, logo que sejam muitas...
Não, nem sequer muitas flores, falai-me apenas
Em me dardes muitas flores,
Nem isso... Escutai-me apenas pacientemente quando vos peço
Que me deis flores...
Sejam essas as flores que me deis...
Ah, a minha tristeza dos barcos que passam no rio,
Sob o céu cheio de sol!
A minha agonia da realidade lúcida!
Desejo de chorar absolutamente como uma criança
Com a cabeça encostada aos braços cruzados em cima da mesa,
E a vida sentida como uma brisa que me roçasse o pescoço,
Estando eu a chorar naquela posição.
O homem que apara o lápis à janela do escritório
Chama pela minha atenção com as mãos do seu gesto banal.
Haver lápis e aparar lápis e gente que os apara à janela, é tão estranho!
É tão fantástico que estas coisas sejam reais!
Olho para ele até esquecer o sol e o céu.
E a realidade do mundo faz-me dor de cabeça.
A flor caída no chão.
A flor murcha (rosa branca amarelecendo)
Caída no chão...
Qual é o sentido da vida?

Fernando Pessoa

LIVROS....


Os livros têm os mesmos inimigos que o homem:
 O fogo, a humidade, os bichos, o tempo
E o próprio conteúdo...

 Paul Valéry

Lobos...



Já não quero mais reflectir,
 Sentir inveja e desprezo pela irreflexão das coisas,
 Encontrar o pathos em cães ou em caligrafias subdesenvolvidas,
 Em jovens raparigas que arranjam o cabelo, todos os castelos de areia
 Caídos por terra à hora de dormir das crianças, junto ao mar.
 Vem a maré e some-se de novo; não quero
 Sublinhar para sempre o seu fluxo, nem a sua permanência,
 Não quero ser um coro trágico ou filosófico,
 Quero apenas olhar de frente o futuro mais próximo
 E depois deixar que o mar nos cubra
. Então, venham todos, aproximem-se, formem um círculo
, Dêem as mãos, façam de conta que, juntas,
 As mãos mantêm afastados os lobos da água
 Que uivam ao longo da costa.
 E que se saiba
 Que ninguém os ouve, por entre conversas e risos.

 Louis MacNeice

sábado, 24 de janeiro de 2015

NOITE....



A Noite é muito escura É noite.
 Numa casa a uma grande distância
 Brilha a luz duma janela
.Vejo-a, e sinto-me humano dos pés à cabeça.
 É curioso que toda a vida do indivíduo,que ali mora
 E que não sei quem é
 Atraí-me só por essa luz vista de longe.
 Sem dúvida que a vida dele é real
 E ele tem cara, gestos, família e profissão...

 Alberto Caeiro, Heterónimo de Fernando Pessoa

QUERO....



Quero Nos teus quartos forrados de luar
 Onde nenhum dos meus gestos faz barulho
 Voltar. E sentar-me um instante
 Na beira da janela contra os astros
 E olhando para dentro contemplar-te
, Tu dormindo antes de jamais teres acordado
, Tu como um rio adormecido e doce
 Seguindo a voz do vento e a voz do mar
 Subindo as escadas que sobem pelo ar.

Sophia de Mello Breyner Andresen

ESTRELA...

Que a tua estrela nos encontre disponíveis
 Para a viagem mesmo sem que percebamos tudo
 Que o seu brilho nos torne pacientes
 Com as coisas não resolvidas do nosso coração
 E nos ajude a amar as difíceis questões
 Que por vezes a noite, por vezes o dia
 Segredam pelo tempo fora
 Que a tua estrela nos faça reconhecer
 Que nunca é tarde
 Para que se tornem de novo ágeis e sonhadores
 Os nossos passos cansados
 Pois nós próprios nos tornamos em estrelas
 Quando arriscamos perpetuar
 A Tua luz multiplicada


José Tolentino Mendonça
Foto/ Spiros Li