domingo, 27 de dezembro de 2015

Vestido Vermelho...



Hoje eu acordei tão certa de tudo.
 Sabe quando você se sente bem?
 Diferente!
 Um vestido,um batom,e pronto...
 Posso hoje enfrentar um mundo.
 Mas o que eu quero mesmo é aproveitar.
 Gosto desse momento, em que não tenho medo de me olhar.
 Estou plena de mim...
 E quando estou assim
, Sou tudo.

 Patty Vicensotti

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Solidão...


"Fiquei sozinha um domingo inteiro.
 Não telefonei para ninguém e ninguém me telefonou.
 Estava totalmente só.
 Fiquei sentada num sofá com o pensamento livre. 
Mas no decorrer desse dia até a hora de dormir
 tive umas três vezes um súbito reconhecimento
 de mim mesma e do mundo que me assombrou
 e me fez mergulhar em profundezas obscuras
 de onde saí para uma luz de ouro.
 Era o encontro do eu com o eu.
 A solidão é um luxo.

 Clarice Lispector

domingo, 20 de dezembro de 2015

Pudesse eu não ter laços ...


Pudesse eu não ter laços nem limites
 Ó vida de mil faces transbordantes
 Para poder responder aos teus convites
 Suspensos na surpresa dos instantes!

 Sophia de Mello Breyner Andresen

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Sem remédio...


Aqueles que me têm muito amor
 Não sabem o que sinto e o que sou...
Não sabem que passou, um dia a dor
 À minha porta e, nesse dia, entrou
 E é desde então que eu sinto este pavor
 Este frio que anda em mim, e que gelou
 O que de bom me deu Nosso Senhor!
Se eu nem sei por onde ando e onde vou!!
 Sinto os passos de Dor, essa cadência
Que é já tortura infinda, que é demência!
Que é já vontade doida de gritar!
 E é sempre a mesma mágoa, o mesmo tédio
 A mesma angústia funda, sem remédio
 Andando atrás de mim, sem me largar!

 Florbela Espanca

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

AMOR SEM FIM...


Meu amor queria ser irracional
Ver você nas asas de gato
Mas gatos não têm asas?
 Você me questionaria
 O amor não tem lógica de existir...
 Quero dançar um balé inventado
Sem nomes complicados
 Sem pontas de pés e sapatilhas
 Quero unhas em minhas costas
 Palavrões num sussurrar de prazer
 Suores emanados pelo ar
 E tendo você a tremer por ter me amado
 Quero amar você...
 Sei que ai é o seu lugar
Mas sei que meu coração fica vazio sem você
Venha sentada num gato alado
 O seu lugar ocupar...

 André Zanarella

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Dai-me flores...


Dá-me lírios, lírios
 E rosas também.
 Mas se não tens lírios
 Nem rosas a dar-me
 Tem vontade ao menos
 De me dar os lírios
 E também as rosas
 Basta-me a vontade
 Que tens, se a tiveres
 De me dar os lírios
 E as rosas também,
E terei os lírios — Os melhores lírios
 — E as melhores rosas
 Sem receber nada.
A não ser a prenda
Da tua vontade
 De me dares lírios
 E rosas também

. Álvaro de Campos

domingo, 13 de dezembro de 2015

OLHAR...


Quando eu for, um dia desses
 Poeira ou folha levada
 No vento da madrugada
 Serei um pouco do nada
 Invisível, delicioso
 Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar
 Suave mistério amoroso
 Cidade de meu andar
 (Deste já tão longo andar!)
 E talvez de meu repouso...

 Mario Quintana

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

EU AMO TUDO O QUE FOI ...


Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já me não dói
A antiga e errónea fé
 O ontem que a dor deixou,
 O que deixou alegria
 Só porque foi, e voou
 E hoje é já outro dia.

 Fernando Pessoa

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Tu tens um medo...


Tu tens um medo: Acabar.
 Não vês que acabas todo o dia.
 Que morres no amor.
 Na tristeza. Na dúvida.
 No desejo. Que te renovas todo o dia.
 No amor. Na tristeza.
 Na dúvida. No desejo.
 Que és sempre outro.
 Que és sempre o mesmo.
 Que morrerás por idades imensas
. Até não teres medo de morrer.
 E então serás eterno.

 Cecília Meireles

sábado, 5 de dezembro de 2015

Ausência...


Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços
que rio e danço e invento exclamações alegres
porque a ausência, essa ausência assimilada
 ninguém a rouba mais de mim...

 Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

As sem razões do amor


Eu te amo porque te amo
 Não precisas ser amante
e nem sempre sabes sê-lo
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
 e com amor não se paga.
 Amor é dado de graça
é semeado no vento, na cachoeira
no eclipse.
Amor foge a dicionários e a regulamentos vários.
 Eu te amo porque não amo bastante ou demais a mim.
 Porque amor não se troca, não se conjuga nem se ama.
 Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo.
 Amor é primo da morte, e da morte vencedor
 por mais que o matem (e matam) a cada instante de amor.

 Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Não te fies do tempo nem da eternidade !


Não te fies do tempo nem da eternidade
que as nuvens me puxam pelos vestidos
que os ventos me arrastam contra o meu desejo.
 Apressa-te, amor, que amanhã eu morro
que amanhã morro e não te vejo!
 Não demores tão longe, em lugar tão secreto
 nácar de silêncio que o mar comprime, ó lábio
 limite do instante absoluto!
 Apressa-te, amor, que amanhã eu morro
 que amanhã morro e não te escuto!
 Aparece-me agora, que ainda reconheço
 a anémona aberta na tua face e em redor dos muros o vento inimigo...
 Apressa-te, amor, que amanhã eu morro
 que amanhã morro e não te digo...

 Cecília Meireles