quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Em nome dos que choram...


Em nome dos que choram
 Dos que sofrem
 Dos que acendem na noite o facho da revolta
 E que de noite morrem
 Com a esperança nos olhos e arames em volta.
 Em nome dos que sonham com palavras
 De amor e paz que nunca foram ditas
 Em nome dos que rezam em silêncio
 E falam em silêncio
E estendem em silêncio as duas mãos aflitas
 Em nome dos que pedem em segredo
 A esmola que os humilha e os destrói
 E devoram as lágrimas e o medo
 Quando a fome lhes dói.
Em nome dos que dormem ao relento
 Numa cama de chuva com lençóis de vento
 O sono da miséria, terrível e profundo,
 Em nome dos teus filhos que esqueceste,
 Filhos de Deus que nunca mais nasceste,
 Volta outra vez ao mundo!

ARY DOS SANTOS

domingo, 3 de setembro de 2017

À Espera dos Bárbaros


O que esperamos na ágora reunidos?
 É que os bárbaros chegam hoje.
 Porquê tanta apatia no senado?
Os senadores não legislam mais?
 É que os bárbaros chegam hoje.
Que leis hão de fazer os senadores?
Os bárbaros que chegam as farão.

 Porquê o imperador se ergueu tão cedo
 e de coroa solene se assentou em seu trono, à porta magna da cidade?
 É que os bárbaros chegam hoje.
 O nosso imperador conta saudar o chefe deles.
 Tem pronto para dar-lhe um pergaminho no qual estão escritos muitos nomes e títulos.
 Porque hoje os dois cônsules e os pretores usam togas de púrpura,
 bordadas e pulseiras com grandes ametistas e anéis com tais brilhantes e esmeraldas
 Porque hoje empunham bastões tão preciosos de ouro e prata finamente cravejados?
 É que os bárbaros chegam hoje, tais coisas os deslumbram.
 Porque não vêm os dignos oradores derramar o seu verbo como sempre?

 (Trecho de À Espera dos Bárbaros, de Konstantinos Kaváfis.